domingo, 10 de janeiro de 2021

SE VOCÊ FOSSE UM PERSONAGEM DE UM LIVRO, QUEM SERIA?

1.    Para responder essa pergunta eu preciso me lembrar dos livros que já li e dos personagens com os quis eu tenha me identificado. É mais fácil me lembrar dos personagens de filmes, dos heróis, a gente se identifica mais facilmente com eles porque, geralmente, a imagem visual é mais forte, é mais impressionante, para aqueles que são mais visuais. Então vou criar essas duas categorias: o personagem do filme e o personagem do livro.

O personagem de filme, que geralmente veem de um livro também, que mais me chama a atenção, é o Homem-Aranha. Eu já o marcara como meu personagem ainda jovem, nas histórias em quadrinhos. Porque já o identificava como alguém próximo, por causa do preço que ele pagava na vida para ser um herói, para ajudar a massa. Pelas suas perdas. Ele tudo perde: seu tutor e tio, o pai da namorada e até sua namorada. A gente torce para que, ao final, ele saia ganhando, mas a única coisa que ele ganha é sua vitória, mesmo que parcial, contra o bandido a quem ele persegue. Alguma justiça é feita, mesmo que para isso ele tenha que se virar emocionalmente com a solidão que vem depois, quando a vida se volta ao normal.

O personagem de livro, eu geralmente me identifico com aquele do livro que estou lendo. Neste caso seria o Riobaldo, de Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa. Ele também tem um enorme histórico de perdas ao longo de suas batalhas internas e externas. Já começa perdendo a mãe, ainda menino. Ganha amigos e amores, para perdê-los ao longo de sua travessia, inclusive seu amigo-amor Diadorim, que morre ao final, quando ele fica sabendo que Diadorim é uma mulher e não um jagunço homem. Essa é sua grande perda. Pelo menos ele reconstrói sua vida ao lado de uma outra mulher a quem ele conhecera no caminho, herda as fazendas do seu pai, que o assume como filho apenas na hora de lhe passar a herança. 


QUAL FOI A ÚLTIMA VEZ QUE FALOU COM SEUS PAIS?

Ontem eu estive em Nova Lima, bairro Cabeceiras, Rua Pio XII, 59. Visitei a minha mãe. Ela tem noventa e três anos e mora com um neto, meu sobrinho. Durante o dia ela tem a companhia de uma cuidadora, uma pessoa gentil que cuida dela e da casa. E aos finais de semana tem sempre alguém com ela, na maioria das vezes uma de minhas irmãs. Minha mãe está bem. Apesar da idade, ela está bem lúcida, bem alegre. O bom humor sempre foi uma de suas características. Hoje em dia ela se lembra mais das coisas do passado mais distante, se esquece do que fez minutos atrás, faz parte da idade e também porque não podemos sair de casa. Tem um vírus lá fora matando pessoas e que nos mantém distantes dos parentes e dos amigos e de seus abraços. É este o momento que vivemos.

Eu passei em sua casa e lá fiquei durante meia hora. Ela gostou da visita, riu bastante e ainda contou alguns pequenos casos. O diálogo com ela, hoje em dia, tem sido de conversas curtas, ela não se lembra das coisas, mesmo assim consegue manter uma conversação razoável porque nós sabemos de que ela precisa. Ela precisa de carinho, de afeto. E ela vê isso em nossos olhos. Ela vê isso em meus olhos. Não demoramos, minha mulher e eu, porque tínhamos outro compromisso. Como ela escuta pouco, não adianta telefonar para ela. Ela não entende o telefone. De vez em quando eu ligo em vídeo com quem está com ela. Assim ela me vê e a acompanhante traduz para ela o que eu falei. E assim se passam os dias atuais com minha mão. E respondendo à pergunta, eu falei com ela ontem.

Com meu pai eu falei a última vez em trinta e um de dezembro de dois mil e treze às dezenove horas e poucos minutos. Faz um tempo, não é? Eu cheguei em sua casa por volta de dezenove horas, entrei em seu quarto e ele estava deitado em sua cama. Quando me viu entrar sorriu para mim e pronunciou meu nome. Eu fiquei ao lado de sua cama até as vinte e duas horas, sentado a seu lado, olhando sua respiração. Foi a última vez que falei com ele. Depois desse dia eu apenas sonhei com ele uma vez. E foi só. No entanto, ele é uma lembrança permanente em minha vida. Seu legado em mim é muito forte.


QUAL É O PRÓXIMO LIVRO QUE VOCÊ QUER LER?

Exatamente ontem comecei a ler “Los cazadores de la unificación perdida” de H. F. Ranea Sandoval, Ediciones Colihue, Argentina. Um livro que fala de Ciências para os que se sentem jovens, ou seja, para mim. É um livro escrito por um físico argentino e que provavelmente vai contar uma história de uma parte importante da Física, justamente a que argumenta sobre as teorias de unificação das leis físicas.

E porque ler isso? Tenho duas razões para tal empreitada: primeiro, eu sou um físico de formação e adoro livros de divulgação científica sobre a Física, principalmente. Aprendi que as leis físicas nos ensinam muito sobe a vida. Se as pessoas tivessem paciência em estudar ciência, aprenderiam que a Física argumenta em torno dos fenômenos da natureza e os fenômenos da natureza têm muito a ver com a nossa vida pois somos partes dessa mesma natureza. Segundo, porque está escrito em espanhol e eu tenho um encontro marcado em menos de um mês com escritores de língua espanhola, pela internet, e preciso estar com a língua espanhola na ponta da língua, para me comunicar com estes escritores.

Sobre o livro em si, o título sugere uma busca, e parodia o filme “Os caçadores da arca perdida” que tem o Indiana Jones como protagonista. A busca em questão é a busca dos físicos teóricos em unificar as teorias da relatividade e da eletrodinâmica quântica, unificação que vem sendo tentada, sem sucesso, desde Albert Einstein. E que, provavelmente, dará fama mundial a seu autor. Imagino que o livro que continuarei a ler hoje se refere a alguns desses cientistas que buscam esta unificação.


O BLOCO DO SUJO E EU

Desde minha juventude saía no famoso Bloco do Sujo, de Nova Lima. Naqueles tempos era só aos domingos pela manhã. Eu, morador das Cabeceiras, não me fazia de rogado. Vestia roupas de minhas irmãs, que cuidavam também da maquiagem, e descia sozinho desde a subestação da Cemig, onde minha família residia de fato, até ... chegar na estrada, hoje Avenida Presidente Kenedy. Porque haviam outros do bairro que tinham a mesma sanha, a mesma vontade de se divertir de maneira diferente. Podem falar qualquer coisa de cunho psicológico, mas vestir-se de mulher no bloco do sujo era uma façanha.

A primeira parada para encontro de colegas travestidos era nos Três Coqueiros. Sim, haviam três coqueiros no local, em fila indiana, esse era o nome daquela encruzilhada. Mais tarde um coqueiro caiu de velho, ficaram dois, mudaram o nome do lugar com o tempo. Hoje não há nenhum coqueiro, o nome Dois Coqueiros se estabeleceu. A partir dos Dois (Três) Coqueiros a turma ia aumentando até chegar próximo ao Bicame onde a Banda do Zé Fuzil começava sua anualmente esperada opereta.

Era onde eu encontrava vários amigos, um bando deles sempre fantasiado de forma diferente e irreverente, um ano de enfermeiras, outro de colegiais, outro de professoras. Muitos desses amigos de juventude ainda estão por aí, muitos eu perdi de vista, um deles foi embora antes da hora, alguns ainda estão em minha mira. Muitos de nós fomos para a faculdade, formamo-nos e fomos trabalhar em outras cidades, cada um em uma localidade diferente, o que permaneceu foi o fato de nos encontrarmos todos os anos no Bloco do Sujo. Eu vestido com roupas não mais de minhas irmãs, mas de minha esposa na época, que também cuidava da maquiagem. Eles continuavam se apresentando de forma organizada. Meu objetivo também era o mesmo, encontrar aquela turma animada para brincar o carnaval.

Anos se passaram e a história se repetia. Encontrávamo-nos no Bloco do Sujo que em dado momento acrescentou os malditos trios elétricos. Herança do axé que de objetos sagrados dos orixás passou a dar nome a um estilo de música baiana difundida inicialmente (pelo menos ao que minha memória me informa) por Luís Caldas e pelos trios de Dodô e Armandinho. Coisa boa da Bahia, mas que aqui nos enchia de impaciência por não ter nada a ver com nossa cultura. Para nossa felicidade tempos depois os trios foram banidos do Bloco do Sujo.

Continuando minha narrativa, alguns de nós, residentes fora de Nova Lima e fieis frequentadores do Bloco do Sujo, continuamos nos encontrando anualmente, nos divertindo muito e contando muitos causos da vida em meios aos batuques da Banda. Eu mesmo residia na cidade de Viçosa e um desses meus amigos em Ipatinga. Porque eu o cito? Porque em um belo domingo de carnaval, eu me dirijo a ele e digo, com cara de espanto: Sabe de uma coisa, meu camarada? Há mais de dez anos que eu só te vejo vestido de mulher! E ele responde: Ora, e por acaso alguma vez nesses dez anos eu te vi vestido de homem?

E duro era voltar para as Cabeceiras depois de muito samba no pé (parece que não era só no pé pois o corpo todo doía), umas cervejinhas na cabeça e o sol das duas da tarde derretendo a maquiagem e o cérebro. E chegar em casa e ainda escutar da mulher: porque demorou tanto? Esqueceu o caminho de casa? Como dizia aquele bichinho, personagem de desenhos animados: Oh céus, oh vida!

 

CARTA PARA EU CRIANÇA

  Não me lembro do dia em que esta foto foi tomada. Minha irmã, essa aí dos olhos arregalados, era um bebê de alguns meses e eu devia ter me...