sexta-feira, 13 de novembro de 2020

O QUE EU TENHO A PERDER?

Esta é uma boa pergunta. Afinal o que eu tenho a perder a esta altura de minha vida, aos sessenta e sete anos? Posso responder a essa pergunta partindo de variados aspectos de minha vida, de ontem e de hoje. Primeiro, vamos comentar sobre o tempo: eu sou um homem muito saudável, não tenho e nunca tive doenças complicadas, nem tomo medicamentos, só algumas vitaminas. Tenho uma mãe de noventa e três anos que também não toma medicamentos. Só está velha, em alguns dias levanta-se com dores nas pernas, mas eu creio que é apenas uma leve depressão, normal para a idade, e nesse dia ela gosta de ficar na cama. E só a esta altura de sua vida começa a perder a memória, não a lucidez. Significa que, do ponto de vista do tempo, eu ainda posso ter uns vinte e cinco a trinta anos de vida pela frente. E se eu continuar me cuidando e, seguindo as práticas saudáveis para o bom envelhecimento, eu posso chegar lá. Quero cuidar desse tempo que ainda tenho pela frente. Quero ganhar mais tempo.

Segundo, eu gosto de escrever e desde adolescente eu sonhava em ser escritor. A vida me levou para outros caminhos, precisava trabalhar em algo que me garantisse a sobrevivência logo. Aos dezoito anos meu pai me deu um “se vira, malandro”, ou seja, a partir dali eu estava por minha conta. Logo fui chamado para ser professor e segui essa carreira por mais de quarenta anos. Comecei a lecionar aos dezoito e parei aos sessenta e um anos. Foi um belo trabalho, eu sei, não o faço mais. Agora conto histórias e estórias de outras formas: principalmente escrevendo. Se terei público eu não sei, mas quero continuar contando histórias enquanto eu for vivo. Quero manter e aumentar estas oportunidades.

Terceiro, eu tenho muitos afetos. A dar e a receber. Eu tive dois casamentos que fracassaram por inabilidade minha, por culpa minha, embora não exclusivamente. Já perdi o afeto delas e no caso da segunda esposa, perdi também o afeto dos filhos dela, a quem ajudei a criar, na vida de quem eu tive uma enorme participação. Hoje eu tenho dois filhos, dois netos, ainda uma mãe, vários irmãos, sobrinhos e alguns bons amigos. E uma nova esposa e uma nova filha. Minha nova esposa é uma mulher muito carinhosa, alegre e dedicada. Quero tê-los a meu lado. Todos. Quero ter todos os afetos comigo. E por perto, se possível. E se estiverem longe fisicamente, que estejam perto, em minha mente.

Quarto, eu não tenho muito dinheiro. Tenho uma aposentadoria que me garante a sobrevivência com dignidade, mas deixei para trás, com minhas ex-mulheres, meu patrimônio construído com muito trabalho. Não me importo muito com bens, meu maior bem é minha vida. No entanto, eu poderia estar muito melhor financeiramente se soubesse e me dedicasse a cuidar mais de minha vida financeira, ou, como dizem hoje, de minha saúde financeira. Não fiz isso. Hoje as chances são ainda menores de criar novo patrimônio. Só tenho como bens, poucas coisas, que cabem no baú de um caminhão de mudanças. Só isso. Penso até em comprar um caminhão e morar nele, tantas mudanças eu já fiz e ainda vou fazer. Então, quero manter minha saúde financeira atual, por mais débil que ela seja. Eu ainda quero ganhar dinheiro, ainda quero ter um patrimônio mais sólido.

Quinto, eu sou um homem muito tranquilo, inteligente, de bom humor. Consigo sair de situações complicadas da vida com elegância e sabedoria. Já me afundei muitas vezes e, até hoje, consegui me levantar de novo. E consegui manter minha calma, consegui manter meu olhar na busca da profundidade das coisas. E minha alegria. Minha alegria, minha calma, minha inteligência são meus maiores patrimônios. Eu resumiria isso definindo-me como um homem sábio. E isso eu quero manter, sempre. Minha sabedoria. Essa ninguém me tira. E quero manter minha lucidez, para manter minha sabedoria.

Resumindo, tenho cinco pontos, características, patrimônios, que quero manter sempre comigo e me lembrar sempre de nunca me esquecer de me lembrar o quão importante essas coisa são: o tempo e a vida que ainda tenho pela frente, com saúde; as histórias que conto e que ainda tenho para contar, em vários suportes diferentes; os afetos, todos os afetos que guardo comigo, inclusive recuperar os afetos perdidos; minha saúde financeira, que quero melhorar, sem dúvida; minha sabedoria, alegria e bom humor. Simples? Sim, simples assim.


QUAL É O LIVRO QUE ESTOU A LER?

Exatamente ontem comecei a ler “Los cazadores de la unificación perdida” de H. F. Ranea Sandoval, Ediciones Colihue, Argentina. Um livro que fala de Ciências para os que se sentem jovens, ou seja, para mim. É um livro escrito por um físico argentino e que provavelmente vai contar uma história de uma parte importante da Física, justamente a que argumenta sobre as teorias de unificação das leis físicas.

E porque ler isso? Tenho duas razões para tal empreitada: primeiro, eu sou um físico de formação e adoro livros de divulgação científica sobre a Física, principalmente. Aprendi que as leis físicas nos ensinam muito sobe a vida. Se as pessoas tivessem paciência em estudar ciência, aprenderiam que a Física argumenta em torno dos fenômenos da natureza e os fenômenos da natureza têm muito a ver com a nossa vida pois somos partes dessa mesma natureza. Segundo, porque está escrito em espanhol e eu tenho um encontro marcado em menos de um mês com escritores de língua espanhola, pela internet, e preciso estar com a língua espanhola na ponta da língua, para me comunicar com estes escritores.

Sobre o livro em si, o título sugere uma busca, e parodia o filme “Os caçadores da arca perdida” que tem o Indiana Jones como protagonista. A busca em questão é a busca dos físicos teóricos em unificar as teorias da relatividade e da eletrodinâmica quântica, unificação que vem sendo tentada, sem sucesso, desde Albert Einstein. E que, provavelmente, dará fama mundial a seu autor. Imagino que o livro que continuarei a ler hoje se refere a alguns desses cientistas que buscam esta unificação.

Lerei outros livros em espanhol, neste mês, porque preciso melhorar minha comunicação nesta língua, como escrevi acima. Pois eu quero conversar bem com os latinos americanos. Pode ser uma boa meta, não é verdade?


QUEM É MEU MELHOR AMIGO?

Esta é uma boa pergunta. Minha resposta: EU NÃO SEI. Ao longo da vida tive uma série de bons amigos. Todos estão longe hoje. Claro, vivemos tempos de distanciamento social, mas eles sempre foram longe. Penso que eu sempre tive dificuldade em ter amigos por perto. Ou talvez eu tenha me deixado influenciar demais por mulheres ciumentas que cobravam de mim uma presença exagerada e, com isso, eu afastava os amigos para evitar caras feias para mim. Erro meu. Uma coisa é certa: como nunca parei nos empregos e nos lugares eu fui mudando de amigos.

Aquele amigo de infância, que nos acompanha pela vida, não tenho. Aquele outro que passa a juventude a seu lado, faz farras juntos, vai namorar juntos, vai a festas juntos, toma as primeiras cervejas juntos, não tenho. Aquele amigo que vira seu padrinho de casamento e por isso pensa que precisa zelar pela relação do casal, não tenho. Aquele amigo que vê seus filhos nascerem, apadrinha um deles e os acompanha crescer, não tenho.

Esta é uma pergunta retórica. O meu melhor amigo é aquele que, no momento, está mais perto? Talvez haja um candidato. Meu vizinho tem se mostrado bom camarada, bom papo, ajuda-me quando preciso, é o que tenho de melhor exemplo de amigo, no momento. E tem, entre aquelas que me acompanham nas redes sociais, alguns que talvez venham a se tornar meus amigos. Dizem que precisamos ter pelo menos uma mão cheia de bons amigos. Então, vou começar a fazer uma lista e testar o nível de amizade deles para construir minha lista.

Os principais candidatos são:

- Meu vizinho, compartilha comigo até suas aflições, ele que é um cara solitário e meio deprimido, mas tem me ajudado bastante nas pequenas coisas do dia a dia. É o que está mais perto. Tem um problema que pode atrapalhar: ele é de direita ferrenho. Mas já tive amigos de direita e que se mostraram bons amigos naqueles momentos em que bons amigos são necessários.

- Outro bom candidato é o amigo de Salinas, monge budista, e que fez a caminhada do sertão junto comigo. Eu o conheci há exatamente um ano atrás, no primeiro dia de caminhada. Mora perto, tem tempo, e tem me convidado para visitá-lo em suas propriedades.

- Mais um caminhante, um vídeo-maker, fotógrafo e virador profissional, tem passado algumas dificuldades no momento e eu tenho mostrado a ele que estou aqui e posso ajudá-lo. Ele responde positivamente a minhas conversas.

- Para colocar uma mulher nesta lista, existe aquela que mora comigo. Mas dizem que as mulheres da gente nem sempre são suas melhores amigas. Tenho dois exemplos disso. Quando você as deixa elas se transformam em inimigas.

- Mas tem uma ex mulher que é uma grande candidata a ser melhor amiga. Alguns testes são necessários.

- O músico caminhante que conheci também é bom candidato. Mora em São Paulo, mas tenho lhe ajudado com donativos nesses tempos loucos de pandemia. Ele se torna um candidato.

- Outros desta lista podem ser: Gisele, Alice, Jo de Aracaju, Pedroso, Cida, Regina.

A lista vai crescer, tenho certeza.

Vou continuar pensando nesta lista. Quero encher pelo menos duas mãos.


QUE MÚSICA SERIA O MEU AUTORRETRATO?

Meu autorretrato seria pintado com uma fusão de várias músicas, todas aquelas que ficaram em minha cabeça durante uma fase de minha vida e me ajudaram a construir meu arcabouço musical e emocional. Na verdade, são músicas que têm a ver minha formação, minha cultura, minhas vivências e minhas emoções. “Submarino amarelo” é uma música forte de minha juventude, dos Beatles, e um dia percebi que era a música que eu ainda assobiava no chuveiro, tantos anos depois. “Sem lenço, sem documento”, de Caetano Veloso, foi uma espécie de hino de minha juventude. Como eu me identifiquei com ela! Outras foram “Travessia” e “Maria, Maria” de Milton Nascimento e inúmeras outras do legado do Clube da Esquina, de Belo Horizonte, por contarem histórias que poderiam ser minhas, ou escritas por mim. E a “Quinta Sinfonia” de Beethoven, mas tocada ao acordeom pelo Oswaldinho. E, mais recente, todas aquelas músicas que dizem respeito ao universo literário de Guimarães Rosa e o sertão mineiro. E tem também a voz de Elsa Soares, a interpretação de Ana Cañas das músicas de Belchior, os Mutantes e principalmente Arnaldo Batista, o “Silêncio” de Arnaldo Antunes. Ou seja, um mosaico bem interessante seria meu autorretrato musical.


O QUE FALTA EM MINHA VIDA?

Faltam tantas coisas em minha vida e, ao mesmo tempo, não me falta nada. Paradoxo? Não, eu explico. Eu tenho uma renda razoável que me permite viver numa boa e isso é muito importante; por outro lado, eu tenho uma dívida grande, mas pagável com minha renda. Se não tivesse esta dívida eu teria um pouco mais de grana para viver. Falta então gerenciar melhor esta dívida para que ela diminua. Eu não tenho uma casa, já tive, então tenho que pagar aluguel, caro. Eu tenho alguns móveis dentro dessa casa alugada, eu tenho uma boa companheira que mora comigo, eu tenho comida farta na mesa, disposição para o sexo com minha mulher, eu tenho músicas tocando o tempo todo, eu tenho paz e calma, eu tenho alegria, eu tenho empatia, eu tenho simpatia, eu tenho vontade de viver, eu tenho vontade de escrever e escrevo, eu tenho pássaros no quintal, eu tenho um cachorro tranquilo e companheiro, eu tenho quadros na parede, eu tenho muitos livros, eu tenho um jardim para cuidar, eu tenho amigos para conversar e trocar ideias, eu tenho trilhas para caminhar bem perto de casa, eu tenho boa cachaça na prateleira para degustar quando quero, eu tenho uma boa cama para dormir quando me canso e tenho sono, eu tenho um carro na garagem, eu tenho um telefone para inclusive telefonar, eu tenho um computador de mesa e um notebook, eu tenho voz para cantar e pernas para dançar. Falta-me o quê? Posso viver muito bem com o que tenho. No entanto, eu gostaria de viajar mais, eu gostaria de ter meus livros publicados, eu gostaria de ter um carro novo, eu gostaria de ter uma bicicleta nova, eu gostaria de saber cantar, eu gostaria de tocar um instrumento, eu gostaria de fotografar mais, eu gostaria de algumas coisas que não tenho. No entanto, estou agradecido por tudo que tenho. Muito agradecido principalmente pela saúde que tenho. Chegar à minha idade e não ter problemas de saúde sérios é bom demais. Grato ao universo, grato à vida, grato aos pais pela herança genética, graças ao mundo por tudo que conquistei, grato pela sabedoria e conhecimento que tenho, grato pelos afetos que posso trocar com as pessoas queridas.

GRATO, GRATO, AGRADECIDO, MUITO OBRIGADO.


SER FELIZ DEPOIS DOS SETENTA

  A pergunta que todos fazem, inclusive eu, é: “é possível ser feliz quando a idade já se representa por um número tão grande? Como? É bem p...