quarta-feira, 21 de outubro de 2015

CONHEÇA-TE A TI MESMO


Hoje eu li em dois livros diferentes a recomendação de "conhecer-te a ti mesmo", em duas situações diferentes. O primeiro, um filósofo (Chistopher PHILLIPS, Sócrates Café) escrevendo sobre o pensamento de Sócrates recomendando o "conheça-te a ti mesmo" considerando que o "eu" é alguma coisa do qual você não pode fugir. O segundo, em um romance de Anton TCHEKHOV (Une banale historie), seu personagem Nicolai Stépanovitch, um "velho" professor de sessenta e dois anos e deprimente figura à espera da morte filosofando sobre seu estado, chega à conclusão que "conhece-te a ti mesmo" é muito bonito e útil mas, no entanto, é lamentável que os anciões não tenham sido avisados a tempo do "modo de emprego". E no mesmo dia tive um cliente em busca do "modo de emprego" para se conhecer a si mesmo e pensar em uma carreira digna. É o "conheça-te a ti mesmo" para não ter essas dúvidas socráticas. A boa questão talvez seja, segundo Tchekhov: - o que você deseja? Quando o personagem Nicolai Stépanovitch pergunta - "o que eu desejo", ele lista uma serie de tais desejos importantes a esta altura da vida em que se vê próximo à morte e descobre que falta algo de essencial, uma ideia geral que liga todos esses desejos. 

E o que liga nossos desejos? Qual a ideia geral deles?Um filósofo americano moderno e um romancista russo do século dezenove colocando-me uma questão séria de Coaching: o que liga o meu "eu" a meus desejos e que os torna tão importantes? 

Como escreveu o velho astrônomo brasileiro Ronaldo Rogério de Freitas Mourão em seu livro A Astronomia em Camões, nossas perguntas e respostas estão na literatura. Basta ler para obtê-las.

quinta-feira, 15 de outubro de 2015

AUTOBIOGRAFIA DESAUTORIZADA X


Escrevo em um dia quinze de outubro, dia em que se “celebra” o dia do professor. Vou dar mais um salto na cronografia dessa autobiografia para comentar como me tornei professor e o que penso da profissão, considerando que a exerci durante quarenta anos. Creio que tenho certa autoridade naquilo que passo a expressar a partir de agora.

Início de março de mil novecentos e setenta e um, não me lembro o dia, sei que era março porque as aulas começavam em março. Eu havia sido aprovado em um vestibular de Física na Universidade Federal de Minas Gerais, ainda em dezembro do ano anterior, matrícula feita e esperando o início das aulas, e havia completado dezoito anos no final do mês de fevereiro. E tinha ganhado uma carta de alforria de meu pai acompanhado de um sermão que terminava com as seguintes palavras: - de hoje em diante, meu filho, SE VIRA. Atrás de você tenho mais oito para criar, portanto vai à luta. Mas ainda eram férias, eu não tinha a menor ideia do que iria fazer, sabia apenas que tinha que começar a trabalhar. Com todas essas preocupações eu jogava futebol todos os dias. Claro, morava ao lado do campo do Montanhês Esporte Clube, glorioso time amador de meu bairro e, além disso, tínhamos um pequeno campo de futebol bem no pátio do nosso território, um espaço ao lado da subestação da Cemig, onde meu pai trabalhava. Éramos quatro famílias morando no local e jogar futebol às tardes, principalmente no verão, era um privilégio raro. E eu exercia sem parcimônia esse privilégio.

Bom, eu jogava futebol, era do time sem camisas, e, em uma tarde especial, por volta das cinco e meia da tarde, eis que para um carro na beirada do campo e dele desce uma mulher elegante, morena, de óculos escuros. Eu a reconheci, era Júnia, amiga de minha namorada Beatriz, professora. O que eu não sabia é que ela era diretora de uma escola pública estadual na cidade de Rio Acima, uns quinze quilômetros depois de Nova Lima onde eu morava e jogava tranquilo meu futebol nas tardes de verão. Óbvio que o jogo parou. Ela me gritou pelo nome, me aproximei todo suado e ouvi, como uma ordem: - toma um banho rápido que eu preciso que você me acompanhe. Preciso de você para assumir umas aulas de matemática na minha escola e as aulas começam às dezenove horas. A minha fama de bom em matemática na escola estadual augusto de lima, onde cursei o científico e onde Júnia lecionava Geografia valeu-me para alguma coisa.

Não titubeei. Ordens são ordens, principalmente vindo de uma chefe morena de óculos escuros e saias mostrando os joelhos redondos, moda da época. Banhei-me e entrei no carro sem pestanejar. Assim entrei no mundo profissional e na carreira de professor.  Chegando em Rio Acima, assumi turmas de quinto e sexto ano, hoje equivalentes a sexto e sétimo ano do ensino fundamental II. Na época os nomes eram outros. Foi muito engraçado de repente eu ter que assumir ares de professor, apenas dezoito anos e tinha pela frente duas turmas de matemática, nenhum preparo, apenas as referências inspiradoras de alguns mestres bem capazes. Era pouco, mas foi assim que comecei.

Dessa data em diante eu me tornei professor. E logo eu tinha quase trinta aulas por semana de matemática no ensino fundamental e física no ensino médio. Foi um longo aprendizado, na marra, mas as turmas eram muito boas, os alunos muito camaradas. Vários de meus alunos desse primeiro ano de trabalho se tornaram meus amigos, alguns eu os vejo de vez em quando até hoje. O bom da profissão é que os alunos não envelhecem, todos anos tem a mesma idade. A profissão é que não nos satisfaz nunca. E geralmente culpamos a ordem estabelecida, o sistema, o governo, etc. Já compartilhei também desse discurso. Depois, com a experiência e mais conhecimento eu acredito que os maiores culpados pelas idiossincrasias da profissão são os próprios professores. Preferem a política do choro, da culpabilidade alheia, que uma luta séria baseada no melhor que a profissão pode oferecer. Como categoria os professores são uns chorões. A luta sindical se baseia em querer colocar todos no mesmo saco e não aceitam nenhuma política de avaliação de eficiência pessoal e sistêmica. Paguem-me mas não me cobrem. Não funciona em nenhum lugar do mundo.

Esse período de trabalho em Rio Acima, com viagens de carro duas noites por semana me renderão algumas páginas. Espero que meus leitores apreciem essas páginas desautorizadas mas escritas assim mesmo. Não quero ser politicamente correto. Quero escrever livremente sobre o que penso que foi a minha vida e reconstruí-la, de certo modo. Análise? Pode ser. Escrever é um processo de reinventar, não de reviver. O melhor do passado é que ele passou. Passou e pronto. Só posso recontar minha história do jeito que eu quiser. Por isso é desautorizada. Eu não fui um cara bonzinho, sem maldades, bonitinho e certinho. Fui um cara do meu tempo, criado numa família de periferia das periferias suburbanas, um pé no mato outro na cidade, cheio de espertezas para sobreviver. Creio que fiz mais mal que bem, até hoje tem gente muito próxima que me diz isso o tempo todo. Coisas do tipo – você é um sacana. Minha cara de anjo barroco, meu sorriso fácil no meio da face, engana a muitos, não engana os mais próximos. Vamos em frente.


sábado, 10 de outubro de 2015

AUTOBIOGRAFIA DESAUTORIZADA IX


Não me lembro de meu aniversário de quinze anos. A data de meu aniversário é fevereiro, as aulas começavam sempre em março naquele tempo. Logo cheguei ao primeiro ano do curso científico turno da noite (só havia no turno da noite) já com quinze anos completos e mesmo assim era dos mais jovens, talvez o mais jovem da turma. Cara de neném, cheia de espinhas, aguentava todo tipo de gozações. A maior delas era que as espinhas eram produtos de muita masturbação. Como eram muitas e se espalhavam pelo meu rosto significava que a punhetagem era muita também. Brigar não adiantava, só aumentaria a gozação.

Em março começaram as aulas. Novos colegas, novos professores, novas responsabilidades. Disciplinas diferentes: Física, Química e Biologia no lugar das Ciências dos tempos de Ginásio. As demais eram as mesmas. Como eram tempos de ditadura havia também uma disciplina com o nome de Organização Social e Política Brasileira – OSPB, que só servia para adestrar cabeças ocas. Como eu já era politizado achava aquilo um saco. No entanto a qualidade da disciplina dependia da qualidade do professor. Tive bons professores dessa disciplina, que minimizavam seu caráter adestrador e traziam boas discussões para a classe e eu, como bom aluno que era, estudava e me saía bem, mas era dureza.

Em março comecei também a trabalhar. Passei em um concurso para ser contínuo do Banco Mercantil e uma nova aventura começou. Trabalhava todos os dias de oito à dezessete horas. O trabalho era maçante, mas aprendi muito. Principalmente a fumar e beber. São as armadilhas onde caem muitos jovens. A vigilância paterna era grande e impediu minha degenerescência. E o tempo era pouco. Trabalhar o dia todo e ir à aula à noite era uma tarefa árdua.

É preciso dizer que fiz quinze anos em mil novecentos e sessenta e oito, ano de muitas ocorrências pelo mundo afora. De muitas ocorrências no Brasil também. Temos muitos assuntos para memorizar desse período e não fugirei deles. Talvez até me autorize a escrever sobre pontos nebulosos dos momentos políticos da época e de minha vida particular. Cheio de altos e baixos, de medos e de aventuras, de muitas descobertas também, como a descoberta da mulher e do mundo feminino. Aí quem fazia a vigilância era minha mãe.

Nessa época conheci também os Beatles, conheci Roberto Carlos e Erasmo Carlos e toda a turma da Jovem Guarda. Eduardo Araújo e Silvinha, Martinha com sua voz manhosa e doce, Jerry Adriani e Wanderley Cardoso. Sergio Reis cantava rock’n roll antes de se tornar sertanejo. E Vanderleia, claro. Minha mãe ainda cantava Orlando Dias, Nelson Gonçalves, Francisco Alves e Ângela Maria. Nas ondas do rádio essas gerações se misturavam e surgiu a Bossa Nova e os festivais da televisão. Com os festivais alguns nomes se destacaram em minha mente, admiráveis nomes e tornei-me fã incondicional: Geraldo Vandré, Caetano Veloso, Os Mutantes e Gilberto Gil. Gilberto Gil cantando Domingo no Parque acompanhado dos Mutantes foi simplesmente um assombro.

Em minha casa não havia televisão, eu assistia às vezes na casa do vizinho (valeu Vicente e Nazinha) às vezes na casa de meu novo amigo, Fran, onde eu passava quase todos as tardes antes de ir para a Escola Estadual Augusto de Lima. Sua casa ficava no zigue-zague, a caminho da escola. Lá eu pegava um rango da tarde, sanduíches geralmente, ou sopa da mãe dele e ainda ficava olhando sua irmã, quem eu achava linda e inteligente. Estou desautorizado a dizer qual delas, ela era mais velha e tinha um namorado simpático, eu gostava apenas de conversar com ela. Fran tinha vários  irmãos e irmãs, não sei de nenhum deles mais, apenas que ele morreu em um trágico e estúpido acidente de carro. Foi em sua casa também que eu assisti alguns capítulos de Beto Rockfeller, uma novela que inovou a linguagem dos folhetins de televisão naquela época.


Não me lembro exatamente das datas de todos esses acontecimentos, apenas que foram entre mil novecentos e sessenta e oito e mil novecentos e setenta, os três anos de duração do curso científico, atual Ensino Médio. Foram três anos profícuos em minha vida e vou escrever muito mais sobre eles. Porque, hoje o sei, eles me formaram, deram o tom de minha vida e, hoje, quarenta e cinco anos depois, ainda me lembro nitidamente daqueles acontecimentos. E enquanto escrevo eles renascem em minha memória.

sexta-feira, 2 de outubro de 2015

RELATOS DE VIAGEM À PATAGÔNIA – A VOLTA


24/03/2014

A saída de El Chalten aconteceu às sete horas e quinze minutos, um taxi veio nos pegar e levar até a Rodoviária, onde tomamos o ônibus para El Calafate. A viagem de ônibus durou três horas e foi bem interessante. Uma van nos esperava na Rodoviária e como tínhamos tempo até a partida do voo, o motorista nos deixou no centre da cidade para último passeio, algumas compras e almoço. Silvania me presenteou com uma bonita boina, parecida com a outra que eu perdi em Uchuaia, só que em couro de capivara e mais bonita.

O voo para Buenos Aires (lotado) também durou três horas. Um taxi nos levou até o apartamento que tínhamos alugado, muito bonito. Jantamos próximo, em um restaurante chamado La Dorita. Comi um filé grosso mal passado, com ensalada del campo e bebi um Pinot Noir Manos Negras muito bom.

Nos dois dias seguintes, vinte e cinco e vinte e seis de março, passeamos bastante pela cidade de Buenos Aires, pelo centro da cidade, pelas praças famosas, pelos museus da cidade, pela Casa rosada, La Boca. La Boca é muito interessante para turista ver, exageram um pouco nos rituais para chamarem a atenção. Procuramos por coisas diferentes do convencional. Claro que sempre encontramos. O não convencional está por todo lado, às vezes escondido em um canto de rua, em uma praça escondida, quem procura acha.

No dia vinte e sete de março era dia de voltar para casa. Fizemos nosso café da manhã, organizamos as malas, trocamos as últimas conversas porque Bernard e Hélène iriam direto para Paris e Silvania e eu para São Paulo.

Toda a viagem se constituiu em um somatório de lições e aprendizados importantes: a organização, a amizade, a disponibilidade para fazer coisas diferentes e inusitadas. Uma grande lição foi a organização da bagagem. O que levar em uma viagem de dez dias?

NA MALA

Três pares de meia, três cuecas, um sapato confortável para caminhar, um tênis para correr (sem atividade física eu não fico), duas calças jeans confortáveis (uma no corpo outra na mala), duas camisetas para ginástica, um calção de nylon, um calção de banho para o caso de ter piscina no hotel ou rios no trajeto, um par de sandálias, uma jaqueta para temperaturas médias e que seja bonita, blusa de inverno se for o caso, dois T-shirts, duas camisas dessas de manga comprida, leve e que não precisem passar, um computador pequeno ou um tablete conforme o motivo da viagem, aparelho de telefone dependendo para onde for. E basta apenas isso.


Assim termino esse relato de viagem à Patagônia. Tenho agora um enorme álbum de fotos e alguns lugares na memória onde quero voltar um dia. 

CARTA PARA EU CRIANÇA

  Não me lembro do dia em que esta foto foi tomada. Minha irmã, essa aí dos olhos arregalados, era um bebê de alguns meses e eu devia ter me...