14 de março de 2014
Atividade do dia: levantar as 03h30min da madrugada, café as
04h00, saída rápida para a estação rodoviária, partida de ônibus as 05h00 para
Punta Arenas, no Chile, com uma parada em Rio Grande.
Dormi boa parte da viagem até Rio Grande. Nessa cidade
tivemos que trocar de ônibus para chegar a Punta Arenas, mas era preciso,
primeiro, passar no escritório da Tachi Austral, a empresa de ônibus, confirmar
a viagem e, segundo, ir até a polícia federal carimbar o passaporte. Feito isso
entramos no ônibus, que demorou a sair porque todos os passageiros deveriam fazer
o mesmo. No ônibus recebemos um cafezinho, um sanduíche e duas medialunas
(croissants). Depois, boa viagem.
Minha leitura de viagem foi o livro “El prisionero de la verdad – Bertrand Russel” de Elisa Bonilla, da editora Alfaomega Colombiana, de 2003.
E foi uma ótima e surpreendente leitura. Destaco aqui alguns pontos
interessantes do livro, citações e comentários.
“Cada pessoa possui um conhecimento que não possuem aqueles
cuja experiência é distinta da sua e esta experiência não pode ser expressa
completamente de maneira verbal. E se recorre a métodos científicos para contar
a experiência, essa se perderá e ficará espalhada em um deserto de poeira. O
mais pessoal de cada experiência tende a evaporar-se durante o processo de
tradução da linguagem.”
Por isso, também segundo Bertrand Russell, não se traduz
conhecimento quando se muda de linguagem para comunicar-se. Na verdade, criamos
outro conhecimento. E cada um que dele se apropria, o amplia de uma forma muito
pessoal.
“Espaço e tempo, tal como os conhecem os seres humanos, não
são, em realidade, tão impessoais como pretende a ciência. O espaço e o tempo
dos seres humanos tem o aqui e o agora... Todo nosso conhecimento dos fatos
proveem de um outro espaço-tempo, que é a pequena região que ocupamos nesse
preciso momento.”
O caminho da felicidade
“Quando um homem sacrifica sua própria felicidade (...) tende
a invejar os que gozam de um menor grau de nobreza, e esta inveja, a miúdo,
volta cruel e destruidora aos que se creem santos.”
Já vi isso muitas vezes, principalmente em algumas mães que
dizem ter se sacrificado a favor de filhos. Quando assustam, estão velhas,
solitárias e reclamando o tempo perdido.
“Se observar homens e mulheres à sua volta que mereçam ser
chamados de felizes, comprovará que todos eles tem coisas em comum. O mais
importante é uma atividade que proporciona por si mesma certo prazer e que,
além disso, é criativa. É impossível ser feliz sem ter alguma atividade, e uma
atividade que não seja excessiva ou desagradável”.
Temos visto muito dessa ideia em nossas atividades de Coaching,
pessoas felizes trabalham em coisas que amam fazer. A atividade é agradável
quando está claramente encaminhada para a finalidade que se deseja,
considerando as habilidades trabalhadas pelo indivíduo em sua formação como ser
humano.
“Se alguém saudável e sem problemas econômicos que ser feliz,
precisa de duas coisas: primeiro, uma estrutura estável construída em torno de um
propósito central (um projeto); segundo, porque o faz exclusivamente porque é
divertido e não cumpre nenhuma outra finalidade séria”.
Após muitas horas de viagem chegamos à fronteira com o
Chile. Que maluquice! Tivemos que descer do ônibus com nossas bagagens de mão e
passá-las por um escâner (as malas grandes, no bagageiro do ônibus, foram cheiradas
por um cão farejador de drogas). Em seguida fomos ao escritório da polícia
aduaneira carimbar nossos passaportes. Quando o Mercosul fará igual à Comunidade
Europeia? Os europeus não carimbam passaporte ao viajar de um país a outro
dentro da Comunidade. Isso significou um atraso na viagem de mais de uma hora.
Carimbados os passaportes, cheiradas as malas, escaneadas as
bagagens de mão, partimos. Transitamos umas duas horas, ou mais, em uma estrada
plana e de terra onde nada se vê além de aves, muitas aves, e carneiros, muitos
carneiros. Nada de tráfego, nada de casas, e muito vento. E assim chegamos no
ponto de travessia do Estreito de Magalhães, sem ponte, travessia a ser feita
de barco. E o que encontramos? Uma fila de ônibus, caminhões e carros, e motos,
todos esperando o barco que não vinha porque o vento estava muito forte. O
vento balançava o ônibus e quase nos jogava ao chão quando caminhávamos.
Segundo escutamos, o vento tem sentido contrário à correnteza do estreito e
isso o torna muito perigoso. Na hora em que escrevia os rascunhos desse texto, 16h,
havia mais ou menos uma hora que estávamos parados e sem perspectiva de
atravessar o canal tão logo. E o vento, o poderoso vento, decidiu que devíamos
esperar um longo tempo, mais de cinco horas.
Enquanto isso terminei a leitura do livro sobre Bertrand
Russell. Ao final do livro tem trechos de textos escritos por ele. Claro que
não é nada comparado a sua obra, enorme. Ajudou-me, no entanto, a pensar em
duas ou mais coisas interessantes que muito se aproximam de pensamentos e
atividades que me ocupam agora, em torno do Coaching. Uma é o conceito de “aqui
e agora”, outro é o conceito de felicidade. Tentarei fazer, aqui, uma ligeira
aproximação entre essas ideias.
Em primeiro lugar, Russell afirmava que cada pessoa possui
um conhecimento único e intransferível por simples tradução de linguagem,
principalmente verbal, e que esse depende de sua experiência individual. E se se recorre a qualquer método de tradução, esse conhecimento se evapora como gotas
de água no deserto arenoso. Interessante que, ao trabalhar com divulgação
científica, sabemos que, hoje, cada pessoa, ao se aproximar e tentar se
apropriar desse conhecimento pode criar um outro, pessoal, e ligado à sua experiência
anterior. A comunicação da Ciência chegou, nos anos dois mil, a uma conclusão
que Russell já afirmava cinquenta anos antes.
Segundo, isso acontece porque os seres humanos tem uma noção
de espaço e tempo que não é impessoal como pretende a Ciência. O espaço e tempo
dos seres humanos tem um Aqui e Agora. E todo nosso conhecimento dos fatos
provem de um certo espaço-tempo que é a pequena região, aquele minúsculo ponto
do universo onde plantamos nossos pés nesse exato momento. Ou seja, tudo que
sei, eu o sei porque estou aqui, nesse ponto, agora, nesse instante, com toda
minha bagagem, minha mochila, minha experiência de vida.
Com relação à felicidade, Russell nos dá uma razão simples
para não abdicarmos da nossa: quem abdica da felicidade, mesmo por uma causa
qualquer, tem inveja daqueles que não o fazem, e essa inveja pode voltar, de
forma cruel e destruidora, contra essas pessoas. Ademais, Russell afirma, pessoas
felizes tem uma atividade prazerosa e criativa. E que é impossível ser feliz
sem uma atividade, desde que ela não seja excessiva ou desagradável (precisamos
do ócio criativo, ele também quase dizia). E essa atividade é agradável quando encaminhada
para uma finalidade, um propósito, sem contrariar os instintos do indivíduo. Ou
seja, Russel já afirmava, hoje confirmamos, a felicidade pode ser encontrada em
atividades com um objetivo definido, agradável, e em paralelo a talentos e
conhecimentos adquiridos.
Resumindo, e trazendo para a linguagem do Coaching:
i. o conhecimento é pessoal e intransferível e
depende de nossa posição no mundo, aqui e agora, ampliando a experiência de
cada um;
ii. essa busca de conhecimento pode trazer
felicidade desde que ligada a uma atividade prazerosa, criativa, ligada a um
objetivo, e que o sujeito a realiza principalmente porque é divertida.
Chegamos a Punta Arenas às 23h, fomos direto ao hotel, nos
instalamos e saímos para jantar. O restaurante La Piedra é perto do hotel
Plaza, e muito bom. Comemos peixe, todos, o meu prato foi uma “Merluza a lo Pobre”.
Não sei porque o nome Lo Pobre, mas tem batatas fritas, e dois ovos fritos sobre
o peixe. Estranho e muito bom. E a cerveja local uma delícia. Os preços? Salgados.
Trinta e oito mil pesos para quatro pessoas, aproximadamente cento e setenta
reais. Considerando o fato de que estávamos em Punta Arenas, sul do Chile, no
meio de quase nada, então está bem. Estava de férias. Dormimos a uma hora da
madrugada e acordamos as cinco e meia, tomamos café as seis horas, e as sete
pegamos uma van que nos levou a um lugar onde tomamos um barco para chegar à
ilha dos pinguins de Magalhães.
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