23/03/2014
Esse foi o dia da caminhada ao Monte Torres e Laguna Torres:
vinte quilômetros de caminhada em quase oito horas. A caminhada foi muito
interessante. O guia Matias estava no hotel às oito horas e trinta minutos para
nos conduzir por uma trilha, uma das muitas possibilidades até as montanhas do
entorno de El Chalten. Escolhemos uma que nos pareceu mais fácil, quase dez
quilômetros até Laguna torres e Cerro Torres. Lago, geleira e montanha visíveis
à frente de quem chega lá. A escolha se baseou em nossas condições físicas
(Bernard estava com problemas no joelho direito) e no fato de que as subidas e
descidas nesse trajeto não são muito grandes. De fato, o caminho não é muito
difícil, poucas subidas e descidas mais acentuadas. O caminho é bem limpo, bem
marcado e sinalizado. Como a cidade vive do turismo eles capricham no
atendimento. O guia falava um francês carregado de erres, à moda argentina, o
que é muito engraçado de ouvir. Gente boa, tranquila, atendeu-nos muito bem
dando boas informações e, ao final, contou um pouco sobre sua vida e sobre a
vida local. Ficamos sabendo, por exemplo, que ele é escalador, que vai muito à
França por isso. Ele parece ter uns quarenta anos, disse-nos que fica em El Chalten
no verão de lá trabalhando como guia de montanha e no inverno local vai para
Chamonix, na França, trabalhar como gui de montanha lá também, ou vai para
outra cidade grande, na Argentina, trabalhar na construção civil, escalando
prédios. Os grandes prédios contratam escaladores para trabalhos mais difíceis.
A trilha passa por estepes, florestas, várzeas de rios,
belvederes diversos com vistas empolgantes da montanha e não tivemos muitas
surpresas. Não vimos uma grande quantidade de aves, os pios não se
diferenciavam muito, mas fomos brindados com um casal de pica-paus, com direito
a pose para fotos. Um da cabeça vermelha (a fêmea), outro da cabeça negra (o
macho). Eles nos deixaram aproximar até uns três ou quatro metros, facilitando
o trabalho dos fotógrafos (Bernard e eu). No trajeto de volta vimos um outro
casal, escondidos, no entanto, nas ramagens das árvores. Ainda faz parte do
caminho riachos de água muito limpa, água de montanha, deliciosa. Uma das
melhores águas minerais que já bebi. Água dos Andes que chegam aos vales
Patagônicos. E nesse quesito, cuidado com as águas, os argentinos ganham
disparado dos brasileiros.
A cada quilômetro a montanha ficava mais próxima, a luz do
sol modificava a paisagem com novas tonalidades e novos brilhos. O mais belo
nos aguardava, entretanto, quase quatro horas depois do início. Subimos o
último aclive do trajeto, naquele momento em que se chega ao fim da trilha
(será?), ao último minuto da caminhada, UAU! A visão do lago (não muito
grande), da geleira azul atrás do lago e da montanha Cerro Torres atrá da
geleira. E o Fritz Roy à direita delas. Eram doze horas e trinta minutos, o sol
brilhava, o céu com poucas nuvens, e o lago verde, calmo, lindo, com alguns
torrões de gelo boiando. Hora do emaravilhamento. Fotos, fotos e mais fotos. E
o lanche. A fome chegou bem na hora do fim de nossa trilha, a ida.
Fritz Roy é o nome do capitão do navio Beagle, o navio
descobridor do canal de Beagle no sul da Argentina e do Chile e que, em sua
segunda viagem à região trouxe a bordo o jovem Charles Darwin. Depois dessa
viagem, e com tudo que ele coletou e observou na região e em outros locais do
trajeto do navio, ele escreveu a teoria da evolução das espécies. Não sei se Darwin
esteve na região de El Chalten, creio que não, no entanto seu nome, o nome do
capitão Fritz Roy e do navio Beagle deixaram registros profuntos por lá.
Voltamos ao hotel Altas Cumbres à dezesseis horas e trinta
minutos e fomos descansar. Uma boa ducha, uns minutos de sono, outro de
leituras, visita ao correio eletrônico, uma pausa enfim. Descansar as pernas.
Combinamos sair para jantar as dezenove horas e trinta
minutos. Como é fim de rua, a cidade esvazia à noite, vários restaurantes
estavam fechados. E precisávamos de um restaurante que aceitasse euros ou cartão
de crédito, nossos pesos argentinos estavam no fim. Tivemos sorte ao entrar no
restaurante Fuegia. Linda e colorida casa e duas mulheres lindas nos atendendo.
Meu prato: biffe a la plancha, papas fritas e vegetales. Biffe vuelta, vuelta,
ou seja, sangrando. Delicioso. E o vinho? Escolhi Desierto 25, Malbec. E pelo
sorriso da atendente eu soube que a escolha era muito boa. Realmente! Um ótimo Malbec
2011, do norte da Patagônia.
Ao fim do dia meu pensamento era: Quando a gente se afasta
de uma montanha com a qual desenvolveu alguma intimidade, é como se afastar de
um ser querido. Essa foi a sensação ao ver de longe a cadeia Cerro torres e a
Fritz Roy. Probabilidade de revê-las? Sempre queremos rever os seres queridos.
Eu sou assim com minhas montanhas, as eleitas como companheiras.
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