domingo, 20 de outubro de 2013

HORÁRIO DE VERÃO


Perdemos uma hora essa noite. Começou o horário de verão (mas é primavera) e o intervalo entre 23h59min e 01h00min foi para o buraco negro. Um lapso de tempo que a Teoria da Relatividade não explica. Eu esperei para ver. E a operadora do celular alterou o horário automaticamente e à minha revelia. Quantas coisas são feitas à nossa revelia e alteram profundamente nossas vidas? Decisões de um grupo de pessoas agindo sobre o coletivo. Tá certo, economizar energia elétrica é uma razão importante, como físico eu até defendo. Segundo os executivos do ministério da energia serão quatrocentos milhões de reais de economia. Mas, e o gasto desnecessário em outras áreas? E o dinheiro mal empregado em obras superfaturadas? E o rolo da corrupção em todas as esferas governamentais? E o desperdício de alimentos no transporte, no armazenamento e no consumo nosso de cada dia? Tudo também à nossa revelia e pouco fazemos para alterar esse quadro sombrio.

Enfim, tive uma hora a menos de vivências hoje, mas estou acordado e atento. Essa noite e este domingo cuido de meu velho e doente pai que precisa de cuidados especiais. Ele está muito fraco e movimenta-se da cama para a cadeira de rodas e vice-versa. Eu, os manos e as manas tentamos dar-lhe o máximo de conforto e atenção. Leva para lá, traz para cá, remédios na hora certa (que hora certa se o verão que ainda não chegou mudou as horas?), alimentação bem cuidada, etc. Plantão de vinte e quatro horas como cuidador de idoso. Minha cota atual de trabalho voluntário. O lado positivo de tudo isso é que eu tenho um grande prazer em fazê-lo. Porque a companhia de meu pai (e de minha mãe também, óbvio) é uma grande honra para mim. Com o passar dos anos nossa relação pai-filho se transformou em relação de amigos. Antes de sua doença eu vinha a Nova Lima quase todos os fins de semana tomar uma cachacinha com ele e comer os tira-gostos dela. Hoje continuo vindo cuidar dos dois. Agora não tomo mais a cachacinha, primeiro porque perdi a companhia etílica, segundo porque devo guardar a lucidez e os reflexos para cuidar deles. O bom humor e o agradecimento dos velhos não tem preço. Esse é meu grande aprendizado atual. Um teste para minha paciência, um teste para minha arrogância, um aprendizado para o resto de minha vida.

As acerolas do quintal de meus pais começaram a amadurecer, tardias como a chuva. As flores de minha mãe continuam bonitas como a primavera. Os sabiás e cambaxirras, todos com filhotes novos, cantam como nunca, ou como sempre. Vinicius de Moraes teria cem anos se vivo ainda estivesse, eterno mais que durou. É a vida, meu irmão, que lateja como dormência nos pés, provocada pelos nervos ciáticos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

O JILÓ DA VIDA 01

  Histórias e Reflexões sobre os Sabores da Existência Antes que você, leitor, estranhe o título dessa narrativa e das próximas que irei p...