quarta-feira, 30 de outubro de 2019

CATÁSTROFE

Resolvi voltar a escrever minhas páginas diárias bem cedo, ao amanhecer, porque preciso reavivar aquela verve de escritor que estava se apagando dentro de mim. Eu sou um escritor. E o que faz um escritor? Ora, um escritor escreve. E eu estava planejando muitos textos, muitos poemas, muitas crônicas, e deixando me levar pelos acontecimentos do dia, me deixando envolver pelas mazelas do cotidiano e perdendo meu foco. 

Escrever apenas as palavras do dia, em páginas de microcontos, como o #quintal e #microcontosfatimaflorentino, é interessante, mas não suficiente. O curso de criatividade que eu fiz me propunha escrever à mão três páginas diárias. Eu escrevo com o que tenho a meu dispor. Se tenho um computador disponível, escrevo usando-o. Se não tenho, bom, sempre tenho um caderno ou um bloco de notas à mão. 

A palavra sugerida pelo grupo #quintal, ontem, não poderia ser mais oracular: catástrofe. E, na hora do almoço, em uma cantina abaixo da represa, seu rompimento pegou a todos de surpresa, naquele sagrado momento de alimentar-se. Quantos mortos? Creio não saberemos. Porque tem a morte imediata daqueles que ficaram soterrados na lama e tem a morte aos poucos daqueles que muito perderam nesse dia: casa, sítios, animais, parentes, esperança. Essa é uma morte ainda pior que a outra.

Sem o imposto da mineração, Minas Gerais seria bem mais pobre que está sendo nos últimos anos. A nossa economia vem se baseando na mineração e no agronegócio de café e gado. Muito pouco para um estado tão grande, com mais de oitocentos municípios, a maioria deles dependente de repasses de verba do governo federal. Isso mostra que tem algo errado. Muita coisa errada, aliás. Primeiro, um município é sempre um sumidouro de recursos que servem apenas para pagamento da máquina administrativa. No Brasil um prefeito, secretários e vereadores, e as instituições que os congregam, têm um custo muito alto. Segundo, o imposto arrecadado nos municípios, em função de sua produtividade, vai primeiro para Brasília para depois voltar aos municípios. Por que o dinheiro arrecadado vai primeiro para o Brasília para depois ser redistribuído? Sim, há a componente de sobrevivência dos municípios pobres, é uma questão de redistribuição de renda. No entanto, há diversas maneiras saudáveis de fazer isso. E de fazer as máquinas executiva, legislativa e judiciária ficarem mais baratas. 

Tudo isso é também uma questão de cultura. Nossa cultura é centralizadora. Estamos acostumados a sermos mandados por um feitor que deve nos dizer sempre o que fazer e como fazer. Temos uma necessidade de obedecer a um governo central, a um todo poderoso presidente da república, quem deve nos dizer como viver. Essa questão cultural é herança dos monarquistas, dos escravagistas, dos latifundiários, antigos donos do poder.
  
O fato é que eu estou ao mesmo tempo puto e envergonhado. Nossas pequenas ações não servem para nada. É chegado o momento de grandes intervenções, de ir para a rua e gritar nossa indignação. Se é que temos alguma, ou será que apenas consideramos que esse é um bom momento para fazermos caridade? 

Que tal pensar um pouco para variar? 
E aqui fecho minha escrita matinal.  

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