13 de março de 2014
Às sete horas estávamos alertas. Oba, uma hora a mais de
sono. Café da manhã e saída de van para uma visita guiada ao Parque Nacional da
Terra do Fogo, localizada no fim do mundo, como dizem os habitantes locais,
terra cheia de histórias e tradições. Se não estivemos no fim do mundo, o
parque é bem próximo. Estivemos no último ponto habitável do sul da América do
Sul. Depois de lá, muitas ilhas com bandeiras governamentais fincadas e, mais
adiante, a Antártida.
Na saída do hotel conhecemos o guia que nos conduziu por
toda a manhã ao parque, ele fala inglês, francês e também o português. Como
estávamos indicados por uma agência francofônica e acompanhado de amigos
franceses e falando franceses ele nos tomou por franceses. Em meio caminho
percebeu que falávamos português, então começou a falar em português também, e
falava bem, disse ser casado com uma brasileira do Rio de Janeiro. O caminho
até o Parque custou meia hora de viagem, isso porque a van parou em outros
hotéis para arrebanhar outros turistas e completar a lotação da van. Eram
pessoas de várias nacionalidades diferentes formando pequenos grupos, não
tivemos muitas oportunidades de iniciar uma conversação. Cada qual com seu
grupo.
Uma vez no parque tivemos duas opções de passeio: pegar o
trem tipo maria fumaça até determinado ponto dentro do mesmo, ou continuar de
van até certo ponto dentro do parque, fazer uma caminhada curta na beira de um
rio até certo ponto onde encontraríamos o grupo que escolheu o trem para
continuarmos a visita. Preferimos continuar na van e fazer o passeio a pé. Foi
uma boa escolha, porque a visita a pé passou por lugares incrivelmente belos.
Durante essa caminhada conhecemos o pé de calafate, fruta nativa na região e
muito comum. Durante toda a viagem pela Patagônia o calafate esteve presente
através de sucos, sorvetes, geleias e licores, além do fruto propriamente (http://pt.wikipedia.org/wiki/Calafate-da-patag%C3%B4nia).
Caminhamos ao lado do Rio Lapataia onde foi possível ver as
florestas de lengas e ñires, grandes árvores da Patagônia, ver os pássaros
locais que parecem não assustar com os turistas, tivemos a impressão que eles
até posavam para fotografias. Outras imagens impressionantes são as das
montanhas, muito altas e com neves eternas em seus cumes. Vimos também uma
represa de castores, animal vindo do Canadá, introduzido por imigrantes e que
se tornou uma praga na Patagônia pelo fato de não ter predadores e suas
represas matarem as árvores locais, desertificando toda uma região às margens
dos rios. Assim como os cães selvagens, os castores são um problema, não só do
parque, mas de toda a Patagônia.
Andando mais parque a dentro, outras surpresas nos
esperavam. Como um casal de raposas que brincava alegremente também sem se
preocupar com os passantes, e éramos muitos turistas, em vans, ônibus e carros.
E as raposas, sentindo-se seguras, talvez, transitavam em meio a nós sem sustos
de nenhuma parte. A ideia de preservação da natureza, ambiente, flora e fauna,
é muito grande na Patagônia. Eles destruíram totalmente os povos que habitavam
aqui, e hoje declaram seu amor às histórias dos índios, suas lendas, seus
mitos, tentam preservar uma memória rica de povos que não existem mais. No
entanto, os argentinos foram ciosos de matarem a todos para ocuparem as terras.
Mas como li em um cartaz em exposição no museu do parque, que narra um pouco da
memória dos povos indígenas,
“se prestas atencíon, quizás
puedas reconocer sus vocês em el sussurro del viento que las esparce por los vales,
donde quizás todavia more Hännus, el gigante del bosque. Voces que,
serpenteando por costas y bahias, todavia inquieten a Laküna, ele demônio marino.
Voces que nos hablan de la tragédia de um Pueblo que ya no existe. Es bueno
escucharlas..., es bueno tener memoria..., es bueno aprender”.
Esse texto, e outros junto com fotos no pequeno museu local
são arrepiantes. Fazem-nos pensar na tragédia, na miséria humana que considerou
que os índios eram animais sem alma, então poderiam mata-los, com a aprovação
da igreja. Matá-los em nome de um deus. Quantos erros não são cometidos por
essa ambição das terras? Quantos de nós não somos também frutos desses erros e
crimes cometidos num passado tão próximo? Não precisei ir à Terra do Fogo, no
Fin del Mundo, para saber disso. Nossa história, minha história, é bem
parecida.
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