Todos que entravam na sala de Vô Ventura viam, em um canto da mesma, um canguru. O que fazia ali aquele animal de uma terra tão distante? Só o Vô Ventura o sabia. Um belo dia ele me contou, muito tempo depois do acontecido. Queria que alguém soubesse.
Quando jovem fez uma viagem à Austrália. Queria visitar uns
amigos que se mudaram para lá e rever uma moça maori que o encantara em sua
visita ao Brasil e deixara seu coração mais parecido com uma batedeira ligada
em duzentos e vinte volts.
Voador de primeira viagem, guardou a localização das
pessoas, endereços, fotos e presentes na mala. Mas ela não chegou
em Sidney. Vô Ventura tem, aliás, um histórico com malas sumidas em aeroportos. Sem a mala ficou perdido, sem lenço nem documento, e sem falar quase nada de inglês.
Perambulou três dias nos corredores do local até encontrar
um brasileiro que o ajudou a comprar passagens de volta para casa, quando pode,
finalmente, relatar a seus correspondentes na Austrália o seu périplo. Menos
para a moça, tão envergonhado ficou.
O canguru na sala é a lembrança da aventura não vivida, ou
vivida às avessas. Os amigos voltaram um dia, mas a moça australiana, que
poderia ser uma amante pela vida, de tão desejada, nunca mais deu notícia.
Por isso dormia abraçado com o canguru nas noites em que sua
mulher viajava. Claro que ela não sabe desse detalhe. Mandou confeccioná-lo
por uma artesã para guardar bem no centro de sua memória o mau resultado da viagem,
suas oportunidades perdidas e, claro, uma, agora vaga, lembrança da moça.
Esse Vô Ventura é o máximo, cada história melhor que a
outra.
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