Envelhecer
bem é saber conviver com o aumento de nossa ignorância.
— Ainda pensa no futuro, vovô?
— Quando ele chegar, eu pensarei.
— Vovô, você não tem mais tanto futuro, então por que não pensar em ter um amanhã melhor?
— Meu neto querido, eu posso estar morto amanhã. Por isso,
tenho que viver o hoje, pensar o hoje, curtir o hoje e agradecer por ainda
existir hoje.
Um diálogo como esse sempre acontece envolvendo os mais
velhos. Nós que trabalhamos muitos anos de nossa vida, até a chegada da mísera
aposentadoria que não paga o nosso tempo de ocupação, mas geralmente é o que nos
sobra para a sobrevivência, não temos que responder a perguntas sobre o futuro.
Se antes não sabíamos o que responder que não fosse especulação, o que sabemos
hoje? Envelhecer bem é saber conviver com o aumento de nossa ignorância.
Temos futuro? Sim, embora ele fique cada vez mais curto.
Precisamos colocar o pensamento nele em nossas prioridades? A isso os
psicólogos denominam de ansiedade. Então, cuidado. Preservar nossos amanhãs é
cuidar bem de nosso hoje. A situação-problema de nosso projeto de futuro reside
neste ponto: o que realizar hoje para termos um belo amanhã. Entre os objetivos
deste projeto devem entrar nossas ainda presentes ambições e os ganhos que
ainda queremos ter. Fácil? Não. Factível? Sim.
— Que ambições você ainda tem, vovô?
— Você pensa que pessoas idosas não têm ambições, meu neto?
Claro que tem. Só que, hoje, não temos mais ambições pelo poder que o dinheiro
nos concede. Se não ficamos ricos até hoje, as chances que temos de enriquecer
são pequenas. Nossas ambições, as minhas, por exemplo, são de manter a qualidade
de vida pelo tempo que nos resta. Nossa principal fonte de poder é a memória. A maior ambição da pessoa idosa é manter o acesso a seu conhecimento,
através da memória, e ter a chance de difundi-lo aos demais. Então, são duas ambições:
manter a chama da memória acesa e ter uma plateia para ouvi-lo, que seja uma plateia
de uma pessoa.
— E os ganhos, vovô? Quais são os ganhos que ainda espera
ter?
— O que queremos é perder o mínimo possível. E ganhar o que
for possível. Mas os principais ganhos pretendidos não são necessariamente materiais.
São ganhos de respeito, de atenção a nossos direitos de ser o que somos e como
somos, de cuidados quando for necessário. Além de alguns outros mais
específicos de cada um.
— Vovô, eu tenho tudo isso que você diz que quer ter. Você
quer ser criança de novo?
— Claro que não, meu neto. Aliás, ser tratado como uma
criança é o pior desrespeito que uma pessoa idosa possa receber. Queremos receber
o amor e o carinho que uma criança recebe, mas com o devido respeito às nossas
rugas. Respeito principalmente às aventuras que tivemos para adquiri-las.
Respeito à nossa história. Enquanto vocês, crianças, precisam ter a mente
aberta para aprender e receber conhecimentos, nós precisamos ter a mente aberta
para doar o que sabemos. Não temos e nunca teremos os conhecimentos que as
mentes jovens conseguem ter, com as tecnologias a que têm acesso. O mundo muda
todos os dias. Mas sabemos muito bem como enfrentar as armadilhas que os
caminhos nos armam. E conhecemos muito bem as pessoas, tanto as amorosas quanto
as maldosas. Esses são nossos diferenciais.
— Quem quiser nos ouvir, meu neto, só terá ganhos, tenho
certeza.
Paulo, as respostas são sábias e tranquilas, exatamente como quem tem discernimento da vida. Parabéns, principalmente pela reflexão da perda e ganho.
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